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ENTRE O CÉU E A TERRA

Deus é a Verdade e a luz é a sua sombra.

Platão

 

O avião é a mais bela escultura cinética que o Homem criou. Majestoso, rompe nuvens e corta o ar com velocidade e ruído. As  luzes enfileiradas das janelas dos passageiros e aquelas que piscam freneticamente do lado de fora – uma prata e outra vermelha – sempre me lembram a Hollywood dos anos 50. Ou luminoso de teatro Broadway.

 

Quando um avião sobrevoa a casa de CARLA PETRINI – ela mora em linha de rota aérea – a emoção não é romântica nem escapista, mas real. Ela sabe exatamente a hora e o momento em que vai falar, em código aeronáutico, com o piloto. Ela sabe tudo sobre esse código. O piloto é seu marido. (Quando soube  disso imaginei um conto que ainda vou escrever. Ou um filme que gostaria de dirigir).

A vida de CARLA Petrini se desenvolve, integralmente, sobre a Terra e isso sua obra de arte não dissimula jamais. Bem ao contrário, evidencia.

 

Olhando suas aquarelas, percebo o mistério da criação do mundo e a força divina se torna muito mais majestosa do que o avião porque, aqui, não há ser humano, só natureza.

Que aula de ecologia perturbadora, essa que vejo diante de mim com essa pintura feita de água diluidora de pigmentos e papel, essa fibra de vegetal!

Entre o céu e a terra das obras de CARLA PETRINI eu me lembro de Frei Luis de Granada que disse: “Não existe coisa mais próxima nem mais distante, mais oculta e mais visível do que Deus”.

Estas paisagens são isto e assim. E CARLA PETRINI conseguiu a façanha de pintar Deus em sua majestosa plenitude. Em sua gloriosa onipotência.

Para participar deste encontro faça como eu: abstraia-se de suas angustias pessoais, seus medos, inseguranças, egoísmos. Relaxe. Imagine a musica do vento, o ruído da água, o estalido de folhas secas rolando pelo chão. Este é o cenário real. E não o de palavras poéticas.

 

Mulher delicada mas forte; feminina e decidida essa CARLA PETRINI tem uma energia e um domínio tão grandioso de sua vontade que ultrapassou, na dramatização da realidade, as lições fundamentais de sua mestra, a igualmente forte Iole Di Natale.

Em todas as outras técnicas utilizadas pelos artistas é possível corrigir o erro, retornar. Na aquarela, não.

É como o por do sol tranqüilo, feito ele próprio da sobreposição de temperatura ambiente, umidade relativa do ar, luz, sombra, brilho. Tudo cronometrado em silêncio absoluto.

Aquarela é pintura da emoção. Um milésimo de fração de segundo de descuido e o todo desabará. Como se um tufão pudesse alterar o crepúsculo pacifico em cenário de tornado onde só houvesse calmaria.

Sabemos dizer o que sabemos sentir, diria Miguel de Cervantes, ele que tanto entendia os ventos e os moinhos.

CARLA PETRINI sabe dizer e sentir também. E como!

 

Tenho orgulho em estar, aqui, nesta Festa de Cores alegres, assim tropicais entremeadas de azuis, pretos, cinzas, abóboras, rosas e amarelos. Onde nunca falta a luz cósmica, essa que conhecemos e nos alimenta a vida natural e aquela outra, divina, onde habitam os anjos e não os gnomos esses baixinhos que vejo como rodapés de Deus.

 

Há um momento em que a Natureza se rebela e para dizer que está viva se agita através do vento. Costuma ser no fim da tarde, começo da noite. O céu fica arrebatador. A terra se solidifica afastando a possibilidade de terremoto.

Nesse exato momento CARLA PETRINI entra em cena.

Suas mãos assim tão delicadas, tão femininas, se transformam e ela, energizada cria. Faz a própria musica de seu bale extraordinário e cria o continente e o conteúdo de uma fábula. Uma, duas, três, mil  pinceladas em veladuras. Da esquerda para a direita. De baixo para cima. Daqui para lá. De cá pra acolá.

Êxtase de luz. Glória da Sombra. Embate do claro e do escuro. Alimento dourado sobre a terra.

Profissionalismo raro entre artistas brasileiros.

O Paraíso é aqui. CARLA PETRINI é um anjo enviado por Deus para nos redimir dos pecados que, há milênios, cometemos impunemente contra a Natureza. Impunemente? Claro que não!

 

Penso no avião rompendo as nuvens e na egolatria de que são feitos muitos artistas também egocêntricos, egoístas. Mas, quero mesmo, é orar e conversar com Deus.

Poderia ir a uma igreja de alvenaria feita pelo homem. Mas prefiro, neste exato momento, estar só e diante de uma aquarela de CARLA PETRINI. Que privilégio! (Muito obrigado, Deus!)

 

Olney Krüse

Membro da ABCA - Associação Brasileira de Críticos de Arte

São Paulo, 6 de julho de 1993

 

 

(Texto de apresentação da exposição individual “Entre o céu e a terra”, realizada na Galeria Lucia Dantas, SP, em 1993 – Aquarelas)

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